TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.190 - Disponibilização: segunda-feira, 3 de outubro de 2022
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Tem-se como pontos controvertidos o direito da autora de resgatar a apólice de seguro, mesmo diante da alegação da parte requerida de que os fatos narrados na inicial tratam-se de furto simples e não furto qualificado como alega a parte autora. Também
controvertem as partes acerca da ocorrência de danos morais.
Aplicam-se ao caso em análise os regramentos atinentes ao Contrato de Seguro, em especial os arts. 757 e seguintes do CC,
bem como a matéria afeta à responsabilidade civil também prevista no aludido diploma legal, com destaque para os arts. 186 e
927.
Da análise acurada dos autos, verifico que realmente existe um contrato de seguro, vigente ao tempo do sinistro que atingiu o
patrimônio da autora, sobre o qual não houve controvérsia. Verifico também que a requerida aceitou a apólice de seguro firmado
com a autora, inclusive recebeu o prêmio correspondente. Tais fatos não foram questionados nos autos.
O Contrato de Seguro, nos termos do art. 757, caput, do Código Civil é um pacto pelo qual o segurador se obriga a garantir interesse legítimo do segurado relativo a pessoa ou coisa, contra risco predeterminado. Desta forma, tratando-se de contrato futuro
e incerto, a verificação do risco assegurado faz nascer para o segurado o direito de exigir do segurador a reparação do dano até
o limite do capital descrito na apólice.
O contrato de seguro é pacto de risco e, dentro dos limites traçados de lealdade e boa-fé, a seguradora deve adimplir a avença.
Entende-se que para que a Seguradora seja dispensada do pagamento, deve haver, por parte do segurado, voluntariedade e
contribuição para o agravamento do risco ou para o acontecimento do sinistro.
Ao que se colhe dos autos, o veículo Toyota HILUX CD, no valor de R$ 126.395,40 (fl. 35-ID 233174711, fl. 13), estava sob a
posse da parte autora, em suas dependências, sendo que em 19/09/2012 o referido bem foi furtado, conforme notícia de fl. 37,
ID 233174711, fl. 15.
A seguradora se recusou a promover o pagamento da indenização pactuada ao argumento de que o furtou teria sido simples, ao
passo que o contrato de seguro firmado entre as partes somente teria cobertura para o furto qualificado.
No entanto, conforme depoimento das testemunhas arroladas pela parte autora, restou demonstrado que o furto do veículo ocorreu na forma qualificada mediante rompimento de obstáculo, qual seja, o rompimento do cadeado do portão pelo qual o veículo
foi retirado do local.
Na audiência de instrução foi colhido o depoimento de duas testemunhas, qualificadas às fls. 201/202.
A testemunha Oswaldo Albuquerque Chagas narrou que era gerente comercial da parte autora, e que no final da tarde foi informado pelo funcionário que o carro que ele colocaria os acessórios não estava na vaga, momento em que procurou o carro nas
dependências da empresa e ao não encontrar foi analisar as câmeras; que os funcionários disseram que entrou uma pessoa
estranha e depois não foi visto mais o carro; que o porteiro falou que o cadeado do portão de trás estava arrombado; que as
câmeras indicaram que a pessoa entrou pela manhã; que ligou para a diretoria e foi à delegacia comunicar o ocorrido; que foi a
primeira vez que o depoente presenciou esse fato; que provavelmente o departamento financeiro do grupo entrou em contato
com a seguradora; que o carro estava no fundo, no box específico para acessórios, mas não se lembra se a chave estava na
ignição; que não se lembra qual foi o horário, mas o carro foi retirado pelo portão que entra o caminhão que recolhe resíduos; que
o cadeado estava quebrado; que não soube na hora que o cadeado estava quebrado, por isso não informou na delegacia; que
não se lembra se no fundo tinha câmeras.
A segunda testemunha arrolada pela parte autora, Sidney Pereira Santos, contou que ficou sabendo do furto no final da tarde;
que viu o rapaz que entrou pela oficina e saiu pelo pátio; que o cadeado do portão do fundo deve ter recebido alguma pancada
porque não estava trancando direito; que liberou o caminhão que estava fazendo a coleta de lixo e quando chegou no portão do
fundo viu que o cadeado não estava mais fechando; que o caminhão que faz a coleta vai à empresa autora de duas a três vezes
por semana; que no dia dos fatos o caminhão foi a tarde; que na coleta anterior o cadeado estava normal; que quando abriu o
cadeado para o caminhão entrar o cadeado estava normal; que só percebeu que o cadeado não estava normal quando foi liberar
o caminhão e que solicitou um novo cadeado para o portão; que somente controla a entrada e saída de veículos no portão da
frente.
Assim, diante da prova testemunhal produzida pela parte autora, restou demonstrado o rompimento de obstáculo que alega para
a configuração do crime de furto qualificado, tipificado no art. 155, §4º, I. Por outro lado, a parte ré não logrou êxito em comprovar
a existência do furto simples, sua única tese defensiva.
A alegação de que o furto teria ocorrido no momento em que o caminhão foi realizar a coleta de lixo, e portanto, sem o rompimento de obstáculo, não foi comprovada nos autos pela requerida, ônus que lhe incumbia, nos termos do art. 373, CPC. Pelo
contrário, conforme o depoimento da segunda testemunha, o furto ocorreu pela manhã e a entrada do caminhão para coleta
somente teria ocorrida no turno vespertino.
Em que pese no documento de fl. 106 constar a declaração do Sr. Oswaldo Albuquerque Chagas, no sentido de que o veículo
teria saído pelo portão lateral que estava aberto para ao recolhimento de lixo residual, trata-se de declaração colhida unilateralmente pela requerida que, uma vez confrontado com o depoimento prestado perante este Juízo, sob juramento de dizer a
verdade nos termos lei, sob pena de sanção penal, este deve prevalecer, comprovando a tese alegada na inicial.
Dessa forma, acolho o pedido autoral para condenar a parte requerida ao pagamento do prêmio do seguro no valor de R$
100.000,00 (cem mil reais), conforme previsão contratual à fl. 26 (ID nº 233174711, fl. 04).
DANOS MORAIS.
Quanto ao dano moral, entendo que não restaram demonstrados os seus requisitos.
De fato, para que haja a condenação em danos morais, é necessário que existam nos autos elementos que caracterizem a violação dos direitos de imagem ou a respeitabilidade da requerente.
Como se sabe, a pessoa jurídica somente tem a tutela da sua honra objetiva, tendo em vista a ausência de alguns dos direitos
da personalidade próprios da pessoa natural.
Neste sentido, para que possa ser verificada a violação da honra objetiva da parte autora seria necessário que da conduta da ré
emanassem efeitos que extrapolassem a relação entre as partes no presente contrato.